As intensas chuvas que atingiram a região metropolitana de São Paulo ontem (11/02) são exemplo de um fenômeno que tem se tornado cada vez mais comum na região, causado em parte pelas mudanças climáticas e pelo processo de urbanização desorganizada da cidade.

Uma análise dos registros das últimas sete décadas mostra que houve um aumento significativo no volume de precipitação nas temporadas de chuva. Enquanto na década de 1950 praticamente não havia dias com chuvas fortes – expressão usada para designar precipitações com mais de 50 mm –, atualmente elas têm ocorrido de duas a cinco vezes por ano nos últimos dez anos.

É o que mostra um trabalho recém-publicado por vários pesquisadores brasileiros liderados pelo climatologista José Marengo, do Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden). “Os eventos extremos estão cada vez mais frequentes, ao mesmo tempo em que a vulnerabilidade da população também”, disse Marengo ao Estado.

“O número de dias secos consecutivos também aumentou gradualmente, sugerindo que os eventos de chuva intensa se concentram em menos dias, com longos períodos mais secos entre eles”, escrevem os autores em artigo nos Anais da Academia de Ciências de Nova York.
Análises feitas sobre séries históricas de registro de chuva feitas pelo Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas da Universidade de São Paulo (IAG-USP) e pelo Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet) apontam que nos meses do verão, neste século, houve um aumento da incidência de dias com fortes chuvas na região metropolitana de São Paulo.

Marengo afirma que as mudanças climáticas podem ter relação com esse aumento de frequência, mas também com o processo de urbanização. “É uma tendência que se observa em todo mundo de que os extremos de chuva estão aumentando. A chuva está caindo de forma mais violenta. Isso pode estar ligado ao clima, mas também pode ser atribuído à cidade. Em São Paulo, onde antes era a Mata Atlântica, hoje é uma cidade. O ambiente mudou. Isso cria um microclima que de certa forma ajuda a chuva a ficar mais violenta”, explica.

Com tecnologias mais avançadas para previsões meteorológicas, especialistas afirmam que os órgãos públicos ainda falham na comunicação e no planejamento de um plano de contingenciamento para, assim, reduzir os riscos à população. “Com os instrumentos que temos hoje, há condições de fazermos alertas e pensar em planos para proteger as pessoas”, diz Carlos Bocuhy, presidente do Instituto Brasileiro de Proteção Ambiental.

Ele compara a situação a outros fenômenos climáticos que ocorrem em outros países, como furacões e ciclones. “São situações extremas e perigosas. Se temos um temporal previsto, por que não alertar a população para que ela possa se proteger? É negligência.”

O consultor em engenharia urbana Luiz Célio Bottura também defende ser preciso elaborar e efetivar um plano de contingenciamento sempre que houver a previsão de temporais. “É preciso ter mais ênfase na previsão e na prevenção. Temporais como este vão se tornar cada vez mais comuns”, diz. Eles destacam que não houve nenhuma comunicação da Prefeitura ou do Estado para alertar a população.

 

 

Fonte: Estadão, 11/02/2020.