O Governo de Minas Gerais anunciou a publicação de dois decretos que regulamentam temas de destaque na agenda ambiental mineira para 2021. O primeiro é o decreto do Programa de Regularização Ambiental (PRA), e que busca fomentar a recuperação ambiental de áreas de vegetação nativa desmatadas em Minas. O segundo é o decreto regulamentador do uso de tecnologias de tratamento térmico para a decomposição das diversas formas de resíduos sólidos no Estado. A iniciativa foi publicada no Diário Oficial do Estado em 30 de dezembro do ano passado.
Além da oficialização dos decretos, por meio da Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Semad) e do Instituto Estadual de Florestas (IEF), também foi anunciada a aquisição de 111 caminhonetes para uso em 43 unidades de conservação de Minas Gerais inseridas nas bacias dos rios Doce e São Francisco. A relação inclui, por exemplo, os parques estaduais da Serra do Rola Moça; Rio Doce; Mata do Limoeiro; Lapa Grande, Serra do Cabral, Sete Salões, entre outras unidades.
“São duas regulamentações muito esperadas para as quais, nos últimos tempos, envidamos esforços para que fossem concretizadas. Com o Decreto do PRA, temos agora novas perspectivas de regularização na área rural e também de ganho de qualidade ambiental”, afirmou a secretária de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável, Marília Melo, na solenidade.
Ela ainda destacou que a regulamentação do tratamento térmico traz segurança jurídica para novos investimentos em tecnologias de tratamento dos rejeitos em Minas Gerais e avanços na política de gestão de resíduos. “O decreto vai nos permitir ampliar o leque de opções de tratamento, principalmente para rejeitos oriundos de resíduos sólidos urbanos, viabilizando inclusive a geração de energia e a redução do volume dos rejeitos encaminhados para aterros sanitários”, ressaltou.
Os anúncios ocorreram durante evento on-line, que também contou com a presença da secretária de Estado de Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Seapa), Ana Valentini, do secretário adjunto de Desenvolvimento Econômico, Fernando Passalio, do diretor-geral do IEF, Antônio Malard, entre outros convidados.
Por meio de um vídeo exibido durante o evento, o governador Romeu Zema destacou a importância dos avanços na agenda ambiental. “Estamos dando um passo importante na área ambiental de Minas Gerais, mostrando que é possível conciliar preservação do meio ambiente e desenvolvimento”, ressaltou.
Regularização ambiental
Publicado na edição desta quarta-feira (27/1) no Diário Oficial do Estado, o Decreto 48.127/2021, que regulamenta o Programa de Regularização Ambiental (PRA), busca acelerar a recuperação ambiental de áreas de vegetação nativa desmatadas, além de criar bases para uma economia voltada para a restauração de áreas verdes.
O instrumento, que é uma forma de regularização ambiental de imóveis rurais no Brasil, foi instituído pelo Código Florestal Federal e traz benefícios para proprietários que se comprometerem a recuperar áreas degradadas ou alteradas, como a extinção de sanções administrativas e criminais, condicionada à recuperação ambiental das áreas em questão. Dados do Cadastro Ambiental Rural (CAR) de dezembro de 2020 mostram que Minas tem 872,2 mil imóveis inscritos no Sicar Nacional, o que classifica o Estado como o de maior número de imóveis cadastrados no CAR, no país. O processo de inscrição no CAR em Minas teve início em 2014.
Existem, ainda, outros três benefícios para aqueles que quiserem aderir ao PRA, conforme o decreto publicado. O grande objetivo é criar condições para que os proprietários busquem a recuperação das áreas nativas desmatadas até julho de 2008, data de corte estipulada pelo Código Florestal.
O primeiro deles é a suspensão de responsabilizações criminais e administrativas, que pode chegar à extinção da sanção caso se confirme a recuperação das áreas em questão. Segundo o diretor-geral do IEF, Antônio Malard, toda supressão de vegetação nativa sem autorização é passível de punição.
“Se você tem um passivo antes de 2008 e resolver aderir ao PRA, as punições administrativa e criminal são suspensas até que você recupere a área. Lá no final, se a recuperação for confirmada, a sansão criminal some e a administrativa é transformada em serviços ambientais”, disse o diretor-geral.
Outro benefício é a possibilidade de recuperação da área degradada de maneira escalonada. Na legislação que vigorava antes do decreto, por exemplo, o autor de desmatamento em Área de Proteção Permanente (APP) de margem de curso d’água era obrigado a recuperar os 30 metros previstos na lei. Agora, ele poderá recuperar uma área menor, de acordo com o tamanho do curso hídrico e com o tamanho da propriedade, desde que atenda aos critérios legalmente definidos de consolidação das áreas.
Uma terceira vantagem oferecida pelo PRA é a possibilidade de recuperação dessa área desmatada não só com vegetação nativa, mas também com sistemas agroflorestais e plantios mistos. “A ideia é permitir ao produtor gerar renda. O IEF espera fomentar a educação para que os proprietários vejam que podem conciliar preservação com produção. O objetivo é criar uma cultura de restauração no produtor rural”, acrescentou Antônio Malard.
Para a secretária da Agricultura, Ana Valentini, além das questões do clima, da segurança alimentar e da qualidade da água, o PRA também contribui para o enfrentamento da pobreza. “Temos observado que muitos pequenos produtores do nosso estado enfrentam uma situação de pobreza em razão da degradação ambiental de suas propriedades. Neste sentido, este decreto traz a possibilidade de que outros atores do processo produtivo possam ajudar esses pequenos produtores em suas ações de restauração e, assim, trazer sustentabilidade para a produção”, afirmou.
Vegetação nativa
No alvo do decreto do PRA estão três tipos de áreas, previstas no Código Florestal: reserva legal, áreas de uso restrito e as Áreas de Preservação Permanente (APPs). A primeira, em regra, deve equivaler a, no mínimo, 20% do tamanho da propriedade, trazendo uma vegetação nativa do bioma em questão.
“A localização é proposta pelo proprietário e é aprovada ou não pelo órgão ambiental baseado em alguns critérios. Importante destacar que a reserva legal não é fixa, comparada, por exemplo, ao caso da Área de Proteção Permanente (APP), que tem localização fixa no sentido de ser composta por áreas geograficamente definidas no Código Florestal”, afirma o gerente de Recuperação Ambiental e Planejamento de Conservação de Ecossistemas do IEF, Thiago Cavanelas Gelape.
Outra classificação é a das áreas de uso restrito, que dentro das diretrizes do PRA se referem a áreas com inclinação entre 25 e 45 graus. O Código Florestal Federal coloca uma série de outros quesitos dentro dessa denominação, mas a regulamentação adotada pelo Estado considerou apenas essa característica dentro da lógica do PRA. A manutenção de vegetação nativa em áreas com esse nível de inclinação diz respeito à necessidade de cobertura do solo para evitar processos erosivos.
Já as Áreas de Proteção Permanente (APP), em geral, têm localização específica, como as margens de cursos hídricos, com metragens variáveis, entorno de nascentes, topos de morros, áreas no entorno de veredas, elevações superiores a 1.800 metros e também entornos de reservatórios naturais de cursos d’água, assim como encostas com declividade superior a 45 graus.
Segundo a coordenadora de Meio Ambiente da Federação da Agricultura e Pecuária do Estado de Minas Gerais (Faemg), Ana Paula Mello, o PRA vai permitir que o produtor rural se torne protagonista do mais amplo programa de recuperação ambiental de Minas. “A entrega do PRA é de fundamental importância para a concretização do Código Florestal”, disse.
O diretor de Conservação da The Nature Conservancy no Brasil (TNC Brasil), Rodrigo Spuri, também participou do evento e destacou que a organização global atua na conservação ambiental, sendo parceira de longa data do IEF em projetos de restauração florestal. “Nessa agenda, nós da TNC temos a missão de ajudar o Estado de Minas Gerais a se tornar referência em restauração, alcançando a meta assumida do Plano Mineiro de Desenvolvimento Integrado (PMDI) de aumento da cobertura vegetal no Estado”, explicou o diretor.
Compensação ambiental
Um avanço importante trazido pelo decreto do PRA aponta para as compensações ambientais. O instrumento normativo permite que as chamadas compensações florestais, que envolvem a recuperação de áreas, possam ser realizadas em áreas do PRA. Ou seja, se o processo de regularização ambiental de um determinado empreendedor exige uma série de compensações em área, ele não precisará adquirir terras para isso, fazendo a recuperação em áreas de terceiros que aderiram ao PRA.
Economia de restauração
Outro ponto de destaque do decreto do PRA é o fomento, que o IEF caracteriza como economia da restauração. De acordo com o gerente Thiago Gelape, os benefícios trazidos no dispositivo para incentivar os proprietários a buscarem a recuperação de áreas nativas tendem a desenvolver uma atividade econômica com potencial de crescimento. “Atividades como a coleta de sementes, produção de mudas e criação de viveiros geram a formação das cadeias desses produtos. O potencial de geração de empregos, produtos e aquecimento da economia é muito grande”, finalizou Gelape.
Com essa intensificação, o IEF prevê resultados dentro do Plano Mineiro de Desenvolvimento Integrado (PMDI), que é o plano macro que norteia o desenvolvimento do Estado em várias áreas e é dividido em partes do Plano Plurianual de Ação Governamental (PPAG). Já foi criado, inclusive, um indicador específico para a restauração da vegetação nativa dentro do PMDI. “Nossa expectativa é chegar em 2030 com a conclusão de que tivemos aumento da cobertura de vegetação nativa com a propulsão do PRA”, sinalizou o diretor-geral do IEF, Antônio Malard.
Tratamento térmico e resíduos
O segundo anúncio feito durante o evento desta quarta-feira foi a publicação do Decreto 48.107, que regulamenta o uso de tecnologias de tratamento térmico para a decomposição das diversas formas de resíduos sólidos no estado. O texto vem para orientar o cumprimento da Lei 18.031/2009, que instituiu o uso da metodologia em Minas. Outra medida ratificada pelo decreto é a proibição da incineração na decomposição de resíduos sólidos urbanos no Estado. A publicação do texto é fruto de uma articulação conjunta da Semad, por meio da Subsecretaria de Gestão Ambiental e Saneamento (Suges), e da Fundação Estadual do Meio Ambiente (Feam).
O texto do decreto apresenta as definições dos métodos de tratamento térmico permitidos no estado – gaseificação, pirólise, plasma e coprocessamento -, além de detalhar como ocorre a incineração.
O subsecretário de Gestão Ambiental e Saneamento da Semad, Rodrigo Franco, ressaltou que o decreto mantém a proibição de incineração de resíduos sólidos urbanos, conforme consta na Lei 18.031/2009. Todavia, a norma permite o tratamento de resíduos sólidos urbanos por meio das demais tecnologias de tratamento térmico desde que comprovada sua viabilidade técnica e ambiental, e que seja implantado programa de monitoramento de emissões atmosféricas aprovado pelo órgão ambiental licenciador.
Rodrigo Franco salientou, ainda, que o tratamento térmico de resíduos sólidos urbanos por meio das tecnologias descritas no decreto somente poderá ser feito após a priorização das etapas de não geração e de redução dos resíduos sólidos urbanos. Além disso, também devem ser cumpridas as etapas de triagem e separação das frações que possam ser reutilizadas ou recicladas. “A regulamentação das tecnologias de tratamento térmico pode promover e estimular investimentos importantes no Estado, com repercussão ambiental e de saúde pública. Trata-se, na prática, de ampliar o leque de alternativas para a destinação final adequada de Resíduos Sólidos Urbanos em Minas Gerais”, avaliou o subsecretário, Rodrigo Franco.
A superintendente de Saneamento Básico da Semad, Lilia Aparecida de Castro, explicou que o tratamento térmico é a modalidade de manejo em que os resíduos sólidos são submetidos a processos que resultam em decomposição térmica, total ou parcial, com ou sem recuperação de energia. O procedimento tem por objetivo a redução de massa, volume ou potencial poluidor. No tratamento térmico estão excluídas as possibilidades em que o aquecimento visa apenas a redução de umidade ou a inativação microbiana do resíduo, sem que haja a decomposição térmica.
Em Minas, a tecnologia já é utilizada para tratamento de resíduos classe 1 (material que apresenta riscos à saúde pública e ao meio ambiente), além de coprocessamento de resíduos em fornos de clínquer. “A regulamentação define as tecnologias de tratamento térmico e esclarece as dúvidas que têm sido apresentadas por investidores e gestores que propõem levar adiante projetos cuja finalidade é tratar termicamente os resíduos sólidos urbanos e, mais especificamente, quando tais projetos são submetidos ao crivo do licenciamento ambiental, momento em que é necessário conhecer a definição de cada tecnologia”, disse Lilia.
Impactos no setor produtivo
O presidente da Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais (Fiemg), Flávio Roscoe, que participou do anúncio do decreto, elogiou a medida e destacou que a regulamentação do tema vai permitir que a sociedade tenha diversos ganhos, entre eles a redução da degradação ambiental, o ganho de mais áreas que antes seriam usadas para receber resíduos sólidos, além do fomento à economia circular.
Também presente no evento virtual, o presidente da Associação Mineira de Municípios (AMM), Julvan Lacerda, pontuou que a questão dos resíduos é um dos temas que mais tira o sono dos prefeitos mineiros e agora o novo decreto vai trazer benefícios nessa área. “Ele está abrindo um leque de solução de problemas e de possibilidade de investimentos muito importante para o nosso Estado”, diz ele.