Cientistas chamam atenção para danos climáticos que já estamos vivendo e que continuarão no futuro, mas garantem que ações urgentes podem garantir um “futuro habitável”

A quarta e última parte do sexto relatório de avaliação (AR6) do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), foi divulgada na manhã desta segunda-feira (20). No novo documento, alguns dos principais cientistas climáticos do mundo reúnem as descobertas mais importantes das três seções anteriores, fazem uma revisão abrangente do conhecimento global que possuímos sobre as mudanças climáticas e nos levam a refletir sobre o futuro, apontando possíveis políticas e ações que evitarão os piores estragos do colapso climático e alertando sobre os impactos de mais aquecimento global.

As três primeiras seções, publicadas em 2022, trouxeram informações importantes sobre a ciência física da crise climática — incluindo observações e projeções de aquecimento para os próximos anos — os impactos da crise climática e como se adaptar a eles, e ainda formas de reduzir as emissões de gases de efeito estufa.

“A integração de ações climáticas efetivas e equitativas não apenas reduzirá perdas e danos para natureza e as pessoas, também proporcionará benefícios mais amplos. O relatório de síntese ressalta a urgência de ações mais ambiciosas e mostra que, se agirmos agora, ainda podemos garantir um futuro sustentável habitável para todos”, disse o presidente do IPCC, Hoesung Lee.

O documento traz para o foco as perdas e danos que já estamos experimentando hoje e que continuarão no futuro, atingindo de forma desigual os mais vulneráveis ​​e os ecossistemas mais fragilizados. No entanto, afirma que optar pelas ações corretas agora pode resultar sim em uma mudança transformacional essencial para um mundo mais sustentável e equitativo.

E, segundo o IPCC, há dinheiro suficiente para tomar as medidas necessárias. Os governos, por meio de financiamento público e sinais claros aos investidores, são fundamentais para reduzir as barreiras existentes, diz o documento. E investidores, bancos centrais e reguladores financeiros também podem desempenhar seu papel.

“Existem medidas políticas já testadas que podem funcionar para alcançarmos reduções profundas de emissões e resiliência climática se forem ampliadas e aplicadas de forma mais ampla. Compromisso político, políticas coordenadas, cooperação internacional, administração de ecossistemas e governança inclusiva são importante para uma ação climática eficaz e equitativa”, dizem os cientistas.

“Este relatório é um apelo para acelerar massivamente os esforços climáticos de todos os países e setores e em todos os prazos. Nosso mundo precisa de ação climática em todas as frentes: tudo, em todos os lugares, ao mesmo tempo”, disse o secretário-geral da ONU, Antonio Guterres.

Para especialistas, tomando por base os três relatórios anteriores dessa série, a evidência é clara: embora haja uma crescente mobilização política, empresarial e social, o cenário ainda é negativo, a menos que o mundo acelere com urgência os esforços para enfrentar a crise climática.

“Embora o tom deste relatório não surpreenda ninguém que esteja familiarizado com os três anteriores, o alerta é coerente: está ocorrendo um progresso lento, mas ele ainda representa apenas uma gota no oceano, em comparação com o tamanho da emergência”, reflete a CEO da The Nature Conservancy, Jennifer Morris.

Para ela, o preenchimento da lacuna entre a ambição prevista no Acordo de Paris e a real implementação de soluções climáticas exigirá novas políticas e programas em maior escala, além da garantia de mais fluxos de financiamento público e privado para a ação climática – custos de curto prazo que são insignificantes diante dos benefícios de longo prazo.

“É fácil perder a esperança quando um relatório após o outro ressalta essas consequências catastróficas, entretanto, vejo que é possível alcançar um futuro melhor. Há indicadores que nos animam: nos últimos dez anos, o custo dos recursos renováveis despencou, ao passo que sua eficiência aumentou significativamente e a conscientização e valorização do potencial de contribuição da natureza para o clima vêm crescendo continuamente”, pondera a especialista.Apesar disso, o IPCC também relembra que esse desafio continua cada vez maior, já que as demandas vistas como fundamentais para que o aquecimento do planeta não ultrapasse o limite de 1,5°C até o fim do século vêm sendo implementadas num ritmo considerado “insuficiente” pelos membros do painel.

Para Guarany Osório, coordenador do Programa Política e Economia Ambiental do Centro de Estudos em Sustentabilidade da Fundação Getulio Vargas (FGVces), o clima do planeta já aumentou 1.2 °C Celsius e não estamos em uma trajetória para manter o aquecimento global abaixo dos níveis considerados como mais seguros pela ciência.

“O Brasil está exposto a vários riscos climáticos e sofrendo seus impactos tal como o ocorrido em São Sebastião. Se não estivermos preparados para adaptação à mudança do clima, o país continuará negligenciando o risco de novas tragédias, impactos que afetam especialmente as mais vulneráveis e grandes perdas econômicas futuras. Aspirações políticas e metas climáticas são importantes e só se sustentam com arranjos e instrumentos de implementação bem desenhados, cronogramas, fontes de financiamento, mecanismos de monitoramento e cumprimento robustos”, explica Osório.

UM SÓ PLANETA – Relatório do IPCC afirma que mundo possui capital suficiente para reduzir emissões de carbono

Disponível em: https://umsoplaneta.globo.com/clima/noticia/2023/03/20/novo-documento-do-ipcc-afirma-que-mundo-possui-capital-suficiente-para-reduzir-emissoes-de-carbono.ghtml

Acesso em: 20/03/2023